Se ocasionalmente nos ocupássemos em nos examinar o tempo que gastamos para controlar os outros,facilmente sentiríamos o quanto toda esse nosso composto é feito de peças frágeis e falhas. Acaso não é uma prova singular de imperfeição não conseguirmos assentar o nosso contentamento em coisa alguma, e que, mesmo por desejo e imaginação, esteja fora do nosso poder escolher o que nos é necessário? Disso dá bom testemunho a grande discussão que sempre houve entre os filósofos para descobrir qual é o "soberano bem" do homem, a qual ainda perdura e perdurará eternamente, sem solução e sem acordo: Enquanto nos escapa o objeto do nosso desejo sempre nos parece outra coisa; vindo a desfrutá-lo um outro desejo.
Não importa o que venhamos a conhecer e desfrutar, sentimos que não nos satisfaz, e perseguimos cobiçosos as coisas por vir, pois as presentes não nos saciam; em minha opinião, não que elas não tenham o bastante com que nos saciar, mas é que nos apoderamos delas com mão doentia.O nosso apetite é indeciso e incerto: não sabemos desfrutar nada da maneira certa. O homem alimenta-se de outras coisas que ele não sabe e não conhece, em que aplica os seus desejos e esperanças.